quarta-feira, 20 de maio de 2015

Pagina 22 A Lágrima de Xavú

     " O que é isso que está tomando conta do meu corpo!?" gritava eu em meus pensamentos. Eu sentia como se não dominasse mais meus braços nem minhas pernas. Sentia apenas uma vibração pulsando dentro de mim... Algo ressoando em todas as minhas veias e artérias. Eu gritava, chingava e minha voz não me respondia. Fui obrigada a ficar inerte no ar até sessar aquela sensação horrível.
     Lá em baixo eu ouvia com clareza e nitidez a risada do velho índio Ínuaixa. Ele não ria, gargalhava! Parecia ter conseguido algo que tivesse lutado a muito tempo. Aos poucos toda aquela sensação ia parando, logo eu pude sentir meus pés tocando o chão frio da caverna. Eu suava muito e me sentia meio enjoada. Agachei um pouco e olhei de relance para baixo.
     - O você fez comigo?! - perguntei - O QUE VOCÊ FEZ COMIGO?!!
     - Não é hora para explicações!! Fique quieta menina... - disse ele com aquele olhar de triunfo - ou seu corpo não irá suportar...
     - Suportar o que? O QUE?!
     - Fique calada Natasha!!! - disse ele meio preocupado querendo adiantar um passo.
     - Calada? CALADA??? - urrei - QUEM É VOCÊ PARA ME MAND...
     Senti uma fisgada forte no meu abdômen. Abaixei um pouco mais quase caido no chão.
     - O que você fez comigo? Ahhhhhh - gritei de dor.
     - Fique quieta menina !!! - disse ele novamente subindo um degrau na escada.
     Urrei alto senti uma força descomunal saido de mim. Ínuaixa deu um passo pra trás, seu olhar era de tensão e entusiasmo.
     - Seu maldito!!!! - disse olhando nos olhos dele. Ele esbaforiu uma reação absorta. Voei sobre ele com uma fúria incontrolável, ele ergueu uma das mãos antes de eu o tocar e tudo se clareou. Perdi a consciência.

                                                 ...

     - Natasha... Natasha!!
     Eu sentia como se estivesse caindo de um abismo, mas na verdade estava voltando pro corpo. Era como se estivesse em um redemoinho, girando e caindo desenfreada.
     - ahhhh!! - gritei assim que abri os olhos. - O QUE ESTÁ ACONTRCENDO? O QUE ESTÁ ACONTECENDO??? - perguntei me debatendo enquanto descortinava os olhos esbugalhados e vermelhos.
     - Calma, calma! - disse uma voz bem a minha frente.
     Senti uma água esguichando no meu rosto. Assutei, pois minha visão estava ainda turva. Olhei pra cima e vi Nhandeara meio plasmado com uma cuia vazia  na mão.
     - como você esta?
     - Como estou? - perguntei ironicamente - pareço bem? - cocei os olhos tentando realinha-los.
     Nhandeara me olhava com certa admiração e excitação. Sua respiração estava levemente ofegante. Eu não estava entendendo nada, pois houve alguns segundos de silêncio que pareceram para mim uma eternidade. Aos poucos eu pude perceber melhor as coisas ao meu redor.
     - O que o senhor está fazendo aqui? - perguntei tentando me levantar, mas algo me segurou no chão.
     - Estava esperando você voltar do seu desdobramento.
     - Voltar? Então o senhor sabia qu... - forcei meu corpo novamente para me levantar, mas algo prendia minhas pernas no chão. - Mas o que está me segurando no chão!? - já estava ficando sem paciencia, e a presença do Cacique Nhandeara me deixava meio sem graça pra dizer umas boas palavras! Ele parecia esconder algo de mim e aquela sensação estava alem de constrangedora muito estranha.
     - Natasha, minha pequena, hoje você deu um grande salto na sua vida energética nesse mundo - dizia ele pacifico e melancólico - a partir de hoje você não mais ser...
     - Senhor... Desculpa, mas eu quero me levantar - cortei ele enquanto forçava meus pés. - tem alguma coisa me segurando? - perguntei tentando ver o que era, Nhandeara que estava na minha frente se levantou meio titubeante. Olhei pros meus pés e dei um grito!
     - O QUE É ISSO????
     Meus pés e pernas estavam todos cobertos por raizes, folhas, galhos... Mas não parecia que alguem tinha os posto ali, era como se saíssem de mim! Como se meu corpo da cintura pra baixo tivesse se transformado em uma árvore estranha e contorcida.
     Gritei desesperada enquanto arrancava da minha pele toda aquelas coisas. Nhandeara me olhava cobiçoso, como se não pudesse acreditar. Seus olhos brilhavam, como se a sua frente houvesse uma pedra preciosa a muito cobiçada. Ele mordia levemente seus lábios tamanho sua excitação.
     - Senhor! Por favor, me ajude!!! - implorei enquanto arrancava das minhas pernas os punhados de raízes e galhos.
     - Não posso Natasha, somente você é capaz de tirar sem te causar dor...
     - como assim? - arranquei mais um outro punhado e arremessei pro lado.
     - É sua conexão com a terra filha, você não só deu um passo nesse desdobramento, você foi muito mais além. É só olhar...
     - Senhor... - tirei os últimos galhos da perna direita - o que vão falar de mim? - perguntei imaginando a cara de Ceci e Saíra. - estou parecendo um bicho... Uma árvore... Ai meu Deus do céu!!!
     - Ninguém poderá saber filha, - ele se abaixou a meu nivel, pegou minha mão e apertou forte ao peito - o que você fez ou viu hoje, ninguém poderá saber Natasha, ninguém!
     - COMO NÃO?!!!  - gritei sem perceber, parei, engoli a seco e continuei recomposta - estou parecendo uma arvore!! Vou contar sim!!!
     - Não, você não vai!
     Nhandeara me encarou com aqueles olhos negros, frios e profundos, sentir o vazio em seu coração, aquilo me deixou confusa e sem chão. Nhandeara é um cacique influente na nossa tribo, está sempre com Kananciuê e Yakekan. Aquilo me deu muito medo.
     - Esculte filha, - ele pegou algo de dentro de uma bolsinha de couro de javali que estava presa em seu peito e Me deu. - esta é a lagrima de Xavú, guarde-a contigo, e no momento certo saberá usa-la. Ela vai te dar as resposta que precisar. Eu não tenho a permissão de te explicar nada aqui, desse jeito como estamos. Mas por favor, guarde contigo essa lágrima, ela será muito importante na sua nova caminhada.
     Olhei aquilo estupefada, sem reação. Algo me induzia a pegar, e eu sentia que não era algo bom. Peguei aquela pedrinha na mão e a segurei. Era pequena, parecia feito de seiva de âmbar. Olhei praquilo, tão pequena e tão misteriosa e guardei em minha bolsinha. Não sabia o que responder, não sabia se deveria agradecer... Preferi ficar no silencio.
     - Não precisa me agradecer filha... - disse ele se levantando, - no tempo certo me procurará, e lembre-se, - virou-se para mim inerte no chão , não conte a ninguém, a ninguém!
     Nhandeara sumiu na mata tão misterioso quanto apareceu. O que era aquela pedra? Por que eu não podia falar para ninguém? Eu pensava enquanto arrancava os tufos de folhas e galhos presos nas minhas pernas com toda pressa e força que eu pudesse ter.


....continua.



M. L.
   
   

   

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