segunda-feira, 30 de junho de 2014

Pagina 17 Quando a luz vence as trevas

          Fechei os olhos do corpo e abri os olhos da alma em seguida. Tudo foi muito rápido e fácil, aos poucos eu ia me acostumando com tudo aquilo. Estava até gostando disso tudo, pensava.
         Estava agora em um lugar totalmente escuro, o ar era úmido e morno, o chão meio escorregadio e frio. Caminhei alguns passos tateando o nada tentando encontrar ao menos uma parede ou algo a que me apoiar, mas parecia que estava no centro do nada. Fiquei assim por algum tempo caminhando de olhos bem abertos e sem nada ver, apenas as trevas de meus próprios pensamentos. Senti minhas pálpebras pesadas com tamanha escuridão. Então ouvi um barulhinho. Parecia uma gota d'água pingando em algo. Me virei para um dos lados do breu e continuei ouvindo. Estava bem a minha direita, e muito perto por sinal. Segui para lá. Então o som parou... pisei o chão e ele estava molhado, era ali que estava pingando, mas onde? Agachei para sentir a água e então uma gota desceu pelos meus cabelos. Pus a mão e senti a gota tocando minha cabeça. Levantei, dei um passo pra trás e tentei pegar as gotas em minhas mãos, eu não sentia sede, mas aquilo me despertou tal sentido. Esperava encher uma pocinha em minhas mãos para beber quando ouvir um grito bem longe. Olhei tentando achar a direção de onde vinha. A voz me era familiar. Ceci? pensei. Onde? Me virei pro breu atrás de mim e a voz sumiu. Vi com clareza um pontinho brilhante lá longe. Meus olhos, engraçadamente, se espremeram quando foquei na luz. Quanto tempo estava ali? Pensei deixando a água de minhas mão caírem como se nunca tivesse tentado pega-las para beber. Era engraçado estar ali, em meus próprios pensamentos, parecia não haver nem tempo nem espaço! Cocei meus olhos e segui rumo a luz distante.
          Caminhei sentindo que ela aos poucos crescia, parecia proposital tudo aquilo, certamente era para que me acostumasse com a claridade. Continuei. Logo conseguia distinguir o que estava do outro lado da luz, era na verdade a entrada... ou saída de onde eu estava. A medida que me aproximava, sentia a luz tomando conta de meu ser, somente mais próximo pude notar que estava numa caverna, pois as paredes próximas a saída estavam bem iluminadas. Vi então alguém passando correndo do lado de fora. Parei. Outra pessoa passou. Foi tão rápido que não deu para distinguir quem ou o que era. Continuei seguindo. Quem poderia ser? Pensava enquanto me aproximava cada vez mais. Ouvi algumas risadas alegres que logo paravam. Pareciam se divertir. Quem estaria lá? Tudo aquilo foi logo me dando uma grande agonia, pois por mais que eu caminhasse mais distante parecia que estava de sair dali. Chegou um momento que eu comecei a correr e a distancia parecia sempre a mesma. Eu começava a suar e agoniar. Os minutos, ou segundos, ou sei lá o que, pareciam congelados. Eu já não sabia mais quanto tempo estava ali, e isso ia me dando uma revolta muito grande! Minha mente projetava todos os xingamentos que eu conhecia, só os piores enquanto as vozes continuavam sorrindo alegremente. Corri mais um pouco e parecia continuar no mesmo lugar. Xinguei espremendo meus dedos.
          "Calma filha... - disse de repente aquela voz que sempre me amolecia de tanta ternura - queira sair de dentro de ti filha. Ainda estás presa dentro de vós mesma... deseje sair, pois essas trevas nada mais são que sua própria mente..."
          - Yakecan? Perguntei abrindo um sorrisinho.
          "Sim filha..."
          Lembrei na hora de Ceci, quando me fez sentir certa inveja por ele estar lá sempre com ela, aparecendo pra ela, e pra mim só de vez em quando...
          "Todos podem me ver - disse-me lendo meus pensamentos - não há mistérios nos mundos além dos vossos, há apenas frequência e consciência diferentes. Estamos trabalhando para que esses fenômenos se torne para vós mais habituais..."
          - Senhor, mas como eu posso vê-lo?
          "Queira filha... assim como tens que querer sair dai..."
          Parei para pensar enquanto fitava a saída da caverna. Eu queria vê-lo, era fato. Queria mostrar pra mim mesma que eu era capaz disso. Comecei então a dizer pra mim: Quero vê-lo, quero vê-lo, quero vê-lo... enquanto forçava em minha mente sua figura, mas nada acontecia. Simplesmente nada!!! Aquilo foi logo me tirando do sério, pensei em Ceci. Pra ela, ele certamente apareceria!!!
          "Mude seus pensamentos filha - disse-me tão próximo a mim como se estivesse ao meu lado - a sua vontade tem que ser maior que a sua vontade de ser... Faça dessa experiência o seu fôlego de sobrevivência, a chama que ilumina sua escuridão. Queira filha, não apenas para mostrar a si mesma ou para outros que és capaz, essa vontade e pensamento nada mais faz do que te prender em seus próprios defeitos. As coisas são simples, assim como és simples nosso pai e criador que estais nos céus... veja, - disse com a voz calma como um rio cristalino e límpida quanto o sol - pense em um botão de rosas, - parou por um segundo - não é necessário muita força para fazê-lo brotar, ele simplesmente brota e nasce, por que é de sua natureza esse fenômeno, assim sois vós minha filha, uma alma livre, capaz de percorrer mundos que sua vivência atual jamais poderia lhe mostrar, apenas deixe que sua vontade seja tão grande quanto sua fé fazendo emanar de seu íntimo a força absoluta necessária para esse aprendizado..."
          Eu não entendia muito o que ele dizia, falava sempre difícil, geralmente me perdia nas primeiras explicações dos fatos, mas de forma estranha suas palavras abriam portas ocultas em minha mente, minha vontade e fé começavam a crescer sem que eu as forçasse muito. Tudo aquilo que presenciava era fruto de que é possível se viver em dois mundos ao mesmo tempo. Eu era capaz, e a prova estava ali, a minha frente, era só estender as mãos! Aquele mundo obscuro, cheio de incerteza, era na verdade minha mente vazia e danosa, e a frente existia a possibilidade, a realidade, a luz, onde pessoas transitavam felizes por ter transpassado pela etapa que eu estava tentando transpassar. Eu quis sair dali, dessa vez não para mostrar para alguém ou para mim que era capaz, mas sim por que eu queria sair, era direito meu estar ali correndo feliz, era direito meu deixar as trevas e adentrar a luz. Era direito meu!
          Quando dei por mim estava envolta pela magnanimidade daquele lugar, sentia às minhas costas a boca escura da caverna, mas eu mesma não estava mais lá. Estava agora do lado de fora! Respirando de forma lenta e prazerosa aquele ar fresco e matinal. Tudo aquilo era divino de mais, era como dizia as lendas sobre os vales verdes distantes, como se Tupã estivesse ali entre nós, me abraçando, me acolhendo... Lagrimas desceram de meus olhos enquanto via as poucas meninas correndo entre as arvores verdes e copulosas, enquanto me encantava com o vento de prata que cortava o horizonte refletindo o céu azul angelical. Caí de joelhos tapando meu rosto, sentindo transbordar em mim todo aquele amor, toda aquela paz, toda aquela plenitude que nunca sentira enquanto caminhava em meu corpo normal.
          - Aqui só é permitido chorar se for de felicidade - disse a Danra de repente bem a minha frente. Senti sua voz nítida e cristalina.
          Olhei para cima e encarei seus olhos negros que me fitavam com tamanha ternura. Levantei num impulso e a abracei. Sentia verdadeira saudades de minha mãe, e poder tê-la ali, era para mim motivo de prazerosa felicidade. Chorei enquanto ela acariciava minhas madeixas soltas e negras. Ela continuou:
          - Deixe filha, que saia tudo! Tudo o que estiver bloqueando suas emoções... filha... aqui só poderás ficar se estiver pura e pronta para as lições espirituais...
         Não sei o que acontecia comigo, eu chorava sem parar, em minha mente tudo o que já tinha sentido e passado caía por terra como uma tora de arvore sendo derrubada por braços fortes.
          - Por que Danra... porque estou assim? - Era a unica coisa que conseguia falar.
          - Estas em fase de aprendizado ainda querida - disse-me com a voz calma e suave - deixe que o seu processo seja o mais natural possível...
          Então alguém me chamou:
          - Natasha? - Olhei retirando do seio de minha mãe o rosto inchado e molhado, meus olhos certamente estavam pequenos e vermelhos. Tentei focar em quem me chamava, mas apenas vi uma jovem como eu se aproximando.
          - Saíra? Perguntei.
          Saíra se aproximava tão leve quanto o vento que soprava meus cabelos, sua fisionomia era totalmente diferente, ela estava linda com sua vestimenta amarelo ocre que descia até o chão. Seus cabelos soltos meneavam brilhantes como se refletissem, como se espelhassem o sol magnânimo sobre nós.
          - SAÍRA!! - gritei sem perceber.... alterando o tom em seguida - você está aqui também!!! Que legal!
          Corri para abraça-la e ela me retribuiu com muito amor, eu me estranhei fazendo aquilo, que lugar era esse para fazia mudar meus hábitos de forma tão rápida e tão profundamente? Eu, se estivesse em meu corpo de carne, certamente não a abraçaria, nem tão pouco a teria como melhores amigas. Mas ali, eramos como irmãs. Lembrei-me de Ceci, será que ela estaria ali também?
          - Vai descobrir, - disse a Danra como se lesse meus pensamentos.
          Olhei para trás e a vi sorrindo para mim, sequei meus olhos envergonhada e virei-me para Saíra, ela ia dizendo algo quando ambas vimos uma luz se projetando do céu e descendo até tocar o chão, esta estava um pouco longe de nós, lá em baixo aos pés da colina onde estavamos. Notei que as meninas se aproximavam da luz de forma harmoniosa, sentando ao seu redor.
          - Vamos? - Perguntou Saíra pegando minha mão.
          - Pra lá? - Perguntei.
          Ela assentiu com um sorriso angelical.
          - Vá filha, - disse a Danra se aproximando de nós - vocês despertaram de dentro para fora, agora receberão a verdadeira lição da alma...
          - Danra...
          Saíra me puxou e ambas descemos a colina em que estávamos. Íamos de encontro à luz. Meu coração se enchia mais e mais de bons sentimentos...























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